O meu dicionário de língua portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa enuncia que ser empreendedor é, a título de exemplo, aquele “que toma a iniciativa ou resolve fazer alguma coisa importante e a inicia, enfrentando, corajosamente, os obstáculos; arrojado; fura-vidas”.
A propósito da morte de Rui Nabeiro, o prestigiado jornal espanhol “El País” escreveu que por causa das suas histórias sobre as vidas na raia, o Sr. Comendador poderia ter sido uma personagem de García Márquez .
Perante tal comparação elegi que Rui Nabeiro foi um “fura-vidas”. García Marquez jamais criaria uma personagem empreendedora nos seus romances, até porque os “fura-vidas” são de sempre e os empreendedores são do nosso tempo, como se os primeiros fossem intemporais e estes últimos de curta duração.
Seria interessante imaginarmos como seria a personagem que o romancista criaria. Talvez um misto de José Arcadio Buendía com Melquíades. Certamente um homem criativo, impulsivo, rejeitando a origem social como sentença condenatória de uma vidinha rural, “lábia” no sentido de cativar e atingir o objectivo e, obviamente, alguns truques que a santidade não é deste mundo, perspicaz, bem humorado, em suma, atento ao mundo e aos outros.
O povo não desconfia só quando a “esmola é muita”. Os elogios consensuais a Rui Nabeiro acabam por nos desconcertar e obrigar à desconfiança. Alguma “o senhor deve ter feito”. Claro que sim, ninguém é impoluto. Agradar a ricos, remediados e pobres, esquerda, centro e direita é incomum. Mas ao pensarmos assim, significa que sentimos a necessidade incontrolável de desacreditar sempre algo e que somos incapazes de reconhecer que alguém é melhor do que nós. Talvez, inveja?
Os perfis de Belmiro de Azevedo, Américo Amorim ou Alexandre Soares dos Santos, entre outros, não são comparáveis. Ainda que o Porto seja a minha cidade, será que os ares do norte bafejam de forma diferente? Estranhas coincidências.
Alexandre Soares dos Santos e Américo Amorim eram naturais do Porto. Belmiro de Azevedo nasceu numa aldeia junto ao rio Tâmega - tal como meu Pai, concelho de Marco de Canaveses, distrito do Porto. Localizam-se “frente a frente” tal qual Tramagal e Rio de Moinhos, só que o enquadramento paisagístico é lindíssimo. Deslizam em cascata até ao rio.
Ver longe não é inventar coisas nem fazer fortuna.
Rui Nabeiro nasceu em Campo Maior, no Alto Alentejo. Será que viu longe porque naquelas terras quase de Espanha não há serras?