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19 JUN 2023
OPINIÃO | "A verdade", por Humberto Lopes
Por Jornal Abarca

Corre os seus termos (2023:05:18) na Casa da Democracia Portuguesa, vulgo Assembleia da República, mais um inquérito para encontrar a verdade sobre acontecimentos recentes num Ministério.

Antes deste inquérito se iniciar, logo após os acontecimentos, várias versões vieram a lume na imprensa falada, escrita e visual. Também nas “tertúlias” dos cafés e das esplanadas cada cabeça sua sentença, sem vias de facto por enquanto.

O que terá acontecido de verdade?

Nunca o saberemos?

A verdade existe?

Cada um de nós vê e analisa os acontecimentos do modo como os vê, se os vê ou, não os vendo, como lhe chegam ao conhecimento. Mas não só, pois a capacidade de análise varia de pessoa para pessoa e, além disso, a nossa verdade depende de como o acontecimento é visto e quais são as nossas afinidades pessoais, afectivas e mesmo políticas que enformam a nossa opinião.

Se duas pessoas presenciarem o mesmo acontecimento ao mesmo tempo e no mesmo lugar é muito natural que as descrições não coincidam!

Já sabemos que no tribunal para descobrir a verdade há, pelo menos, duas versões: a do arguido e a do acusador. Normalmente são contraditórias, como se diz. O julgamento de um acontecimento deve ter em conta estas duas, ou mais, versões do que se passou.

No entanto, hoje em dia, tudo se passa tão depressa que não há tempo para ouvir as partes e apenas com uma versão se faz a notícia! Antes que a justiça se pronuncie já arguidos foram condenados publicamente, outros publicamente absolvidos.

Os tempos da justiça popular voltaram?

Podemos imaginar a dificuldade de um juiz para descobrir a verdade e poder, com justiça, condenar ou absolver.

Imaginem agora os não juízes que andam por aí com mais ou menos ciência, mas que não têm problemas de consciência para aplicar penas ou absolvições!

Mesmo em sede da Casa da Democracia!

Temos assistido, através das imagens da TV, aos interrogatórios e às respostas dadas na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP. Do que temos visto e ouvido é possível tirar uma conclusão da qual podemos dizer “esta é a verdade”?

Os próprios intervenientes têm versões diferentes do acontecimento! Será que uns dizem a verdade e outros não dizem a verdade, todos de boa-fé?

Suponhamos que duas pessoas participam num acidente entre as suas viaturas. Acontecimento observado no mesmo momento, embora em lugares diferentes, pelos dois intervenientes. Será que as versões serão as mesmas, ou serão opostas?

E se houver testemunhas no exterior colocados nas proximidades terão também versões semelhantes?

Suponhamos ainda que dois observadores ouvem uma explosão que se deu a uma certa hora: 15 horas. Um dos observadores está a 3.400 metros do local da explosão e o outro está a 6.400 metros do mesmo local. O observador mais perto vai dizer que a explosão se deu às 15 horas e 10 minutos, o segundo vai dizer que a explosão se deu às 15 horas e 20 minutos! Ambos de boa-fé.

É que há fenómenos físicos, e não só, que alteram as nossas observações. Não damos conta deles, mas eles existem e impedem-nos de ver a verdade. Cada um julga, de boa-fé, estar a relatar a verdade, embora seja apenas a sua verdade diferente da verdade do outro.

Afinal onde está a verdade?

Apenas e tão só em cada um de nós.

A verdade verdadeira não existe!

 

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