Há dias vi um vídeo nas redes sociais que demonstra o longo caminho que ainda há a percorrer no Portugal medieval dos costumes. A brincadeira, numas festas populares no concelho da Lourinhã (se a memória não me engana) consistia numa espécie de picaria em que soltavam um touro na praia, com o recinto vedado por três lados. O lado aberto, já imagina o leitor, é o que dá para o mar. O animal, que alguns dizem bravo, no meio da aflição só encontra fuga para as águas do Atlântico. Recusei-me a ver até ao final, por isso desconheço como termina.
Nem preciso de ver o final para me revoltar contra estes seres que encontram na humilhação e sofrimento de outro animal a sua forma de diversão. Continuo sem entender como estas “brincadeiras” continuam a existir e, em muitos casos, patrocinados por Juntas de Freguesia ou Câmaras Municipais. Estamos em 2024 com comportamentos de 1324.
Depois acontecem tragédias como as de Évora em que um homem alcoolizado morreu a desafiar um animal de centenas de quilos. Não foi azar, lamento. Fico profundamente triste por este homem, com dois filhos, ter falecido. Mas não foi azar. Estar alcoolizado e ter deixado dois filhos não lhe diminui a responsabilidade, pelo contrário. E a culpa não é do touro, é de todos aqueles que continuam a achar que esta actividade completamente insensata continua a fazer sentido.
Há dias Bruxelas proibiu carruagens puxadas por cavalos. É uma boa notícia e mais um pequeno passo para terminar com o sofrimento dos animais à custa da preguiça e inconsciência dos seres humanos. Estive recentemente de férias numa ilha, longe de Portugal, com cerca de três quilómetros quadrados - estamos a falar de uma ilha menor do que a maioria das aldeias da nossa região, uma ilha em que se vai dos pontos mais distantes em cerca de 40 minutos a pé ou 15 de bicicleta.
Mas, porque os veículos motorizados aqui são proibidos, as formas de deslocação resumem-se a caminhar, bicicleta ou... carruagens com cavalos. São dezenas os nativos que se dedicam a explorar estes animais à custa de acéfalos turistas que, achando a cena saída de um qualquer filme romântico de Hollywood, se recusam a fazer 10 minutos a pé até chegarem ao hotel e a isso sacrificam um animal que, no quente e abafado mês de Agosto, caminha a espumar-se, cansado e com centenas de quilos no lombo apenas para satisfazer a sensação de burguesia destes preguiçosos - que depois tiram fotos no ginásio e publicam para o mundo ver como eles gostam de se mexer.
Falta muito para chegarmos a um ponto mínimo de decência. Faço notar que aqui não entrei em temas sensíveis, que alguns apelidam de wokismo (seria interessante dedicarem-se a descobrir a origem do termo), mas a coisas básicas: como a nossa preguiça e crueldade provoca uma dor imensa e desnecessária em animais inocentes. Há um nome para isso: somos primitivos.