Finda a Segunda Guerra Mundial foi sentida a necessidade de criar uma organização que tivesse como objectivo “preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra” – art.º 2.º da Carta das Nações Unidas. Que ideia genial! Manter a segurança e paz no mundo e promover os direitos humanos.
Este sonho tornou-se realidade. Assim nasceu a Organização das Nações Unidas em 24 de Outubro de 1945, na cidade São Francisco, a mesma que anos mais tarde, em 1967, dava origem a um hino que convidava as pessoas a levarem flores no cabelo cada vez que a visitassem “If you ´re going to San Francisco be sure to wear some flowers in your hair”.
Contudo, desde a sua criação até aos nossos dias, já ocorreram mais de 250 mil conflitos e até genocídios: 800 mil civis, entre os quais crianças, que foram deixados à sua sorte e mortos em dez dias à catanada no Ruanda, com a cumplicidade dos países membros da Organização das Nações Unidas e os olhares das forças da ONU que receberam, expressamente, ordens para não intervir.
Ou ainda, o genocídio na cidade de Srebenica, Bósnia, quando cerca de 4 milhões de civis inocentes foram mortos, sem que os noticiários e os políticos o denunciassem.
Chamar o Ruanda à colação neste momento será extemporâneo?
Nunca o será quando a visibilidade dos povos contínua dependente da sua geografia/importância geo-estratégica, recursos e cor. Atente-se no Sudão que é, presentemente, a guerra com mais mortes e na indiferença a que o condenámos.
Esta indiferença passará hoje, também, pela realização de mais uma Assembleia das Nações Unidas que está a decorrer em simultâneo com o estado de Israel a bombardear o sul do Líbano. Que caricatura!
Vem-se acentuando a fragilidade da ONU que tem no seu Conselho de Segurança o ex-libris do esvaziamento dos seus propósitos, através da permissão do direito de veto. Na geometria este Conselho seria, certamente, uma circunferência.
Qual a eficácia de uma resolução da ONU, se dos cinco países com assento permanente no Conselho de Segurança – Estados Unidos, Reino Unido, França, República Popular da China e Rússia – um deles usa o direito de veto que está consagrado no artigo 27 da Carta das Nações Unidas? Nenhuma, obviamente. Pode aceitar-se que é o esvaziamento da sua utilidade.
A própria composição deste conselho também é questionável.
Reflecte uma geopolítica desfasada da actual pois circunscreve-se ainda, à realidade do pós segunda guerra. Penso até que deveria existir uma cláusula de revisão que permitisse repensar não só a sua composição, como o voto ser dado em função do contributo/desempenho de cada país. A título meramente exemplificativo, comparemos a China que integrou este conselho à actual República Popular da China com o seu poder económico. São “Chinas” muito diferentes.
Que fazer com a China e Rússia que violam diariamente os direitos, valores e princípios que imbuem a Carta da ONU, sem qualquer norma que puna a sua actuação?
Não posso concluir porque também não é verdade, que a ONU está obsoleta. Os acordos bilaterais continuam a justificá-la, bem como o desempenho de alguns dos seus estados membros que se reinventaram no papel de mediadores. Mas a sua “salvação” terá que passar, indubitavelmente, pela reafirmação dos seus direitos, princípios e valores e responsabilização de estados que violem estes, como, por exemplo, a Rússia, ao não respeitar fronteiras.
Mas urge voltar a San Francisco e repensar a ONU.
De preferência com flores.