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21 OCT 2024
OPINIÃO | "Quem são estes abrantinos de hoje?"
Por Jornal Abarca

Foi com esta pergunta que terminei a minha última crónica, de um conjunto que dediquei às dicotomias abrantinas. A mais relevante para a presente crónica, aquela que põe em confronto diferentes gerações de abrantinos e em particular a minha geração (ou o seu tempo,...) e as gerações actuais (ou o tempo delas,...).

Em primeiro lugar é necessário estabelecer o seguinte: quando falamos de gerações com influência em Abrantes por volta de 1974 e procedemos à comparação com gerações actuais devemos ter presente que estamos a falar de, pelo menos, quatro gerações (admitindo que há duas gerações que coincidem com o 25 de Abril; e há duas gerações que se consolidam até à actualidade). Em termos práticos, a primeira geração anterior a 1974 não tem qualquer relevância dado que a maioria dos seus membros está hoje muito velho ou desapareceu. A segunda, que é a minha, está em vias de desaparecer de cena. O que faz com que, actualmente, as gerações relevantes para o futuro de Abrantes sejam as duas gerações que vêm já depois de 1974.

Em concreto quem hoje é relevante, em termos geracionais, em Abrantes, são os filhos e os netos da minha geração.

De um modo muito breve estaria encontrada a resposta à questão que encima esta crónica: “Quem são estes abrantinos de hoje?”. Nada mais simples: são, como se escreveu atrás: “os filhos e os netos da minha geração.”

Aparentemente esta resposta encerra a questão; mas não fecha a de saber porque é que a cidade dos filhos e dos netos é tão diferente da cidade dos pais (ou talvez não,...). Sobre o facto de a cidade atravessar uma crise de identidade parece não subsistirem muitas dúvidas (com excepção dos costumeiros “beneficiários do sistema”) e alguma unanimidade. Já nem todos estarão de acordo com as causas. Nem com os principais responsáveis pelo declínio (se é que houve e se é que há declínio - tudo parece depender da perspectiva).

Eu sei que não é fácil analisar o presente. Sobretudo quando as pessoas são simultaneamente autores e actores do seu próprio presente. O que torna difícil ser isento no julgamento das questões que se podem colocar sobre a Abrantes de hoje e o hipotético declínio que atinge a cidade.

Há duas coisas que eu sei, com segurança e que tanto se aplicam à minha geração de abrantinos como às gerações que aí estão activas e dominando as escolhas que a cidade faz.

A primeira centra-se no legado que a minha geração fez às gerações vindouras. Sem que eu perceba bem o porquê, esse legado é um desastre anunciado: sem qualidade, desprovido de valores autênticos e sem uma visão solidária do futuro. Deste ponto de vista, o resultado que temos hoje não poderia ser outro.  

A segunda tem que ver com as cedências que foram feitas a concepções do mundo e da vida que pouco ou nada tinham que ver com a tradição abrantina: o que poderá ser assacado ao grande crescimento que a cidade teve e à incapacidade que as gerações tiveram em integrar as mudanças que iam ocorrendo a um ritmo muito elevado e que geravam instabilidade ao mesmo tempo que nenhum sistema de valores e da sua transmissão era implementado. A incapacidade em integrar a política no modo de vida das gerações abrantinas foi um desastre; a perda da “regra dos dois” outro tanto. As gerações que se sucederam a 1974 viram-se, assim, numa cidade que não tinha referências e que se olhava a si própria com indiferença: mais preocupada com as aparências do que as consequências. E essa é uma culpa que a minha geração tem e da qual não pode, nem devia fugir.

Por que é nessa indiferença dos abrantinos perante si mesmos que reside muito do declínio que atinge a cidade: à espera de uma geração que se afirme e se distancie dessa herança. 

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