Os dramas diários, das famílias que todos os dias enfrentam o desemprego, a incapacidade de darem resposta aos compromissos financeiros, o que as leva a entregarem a própria casa aos bancos, acarretam comportamentos depressivos, angustiantes que as limita a arregaçar mangas e a tentar descortinar novos meios de vida
Surgem problemas de saúde mental, a que o Sistema Nacional de Saúde não consegue dar resposta, como já não conseguia antes da situação que se vive actualmente no país.
“Quase metade dos portugueses afetados por doenças mentais severas não são tratados nos serviços de saúde, uma situação ‘sem par’ noutras enfermidades, afirma o especialista José Miguel Caldas de Almeida, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa (UNL).
A Lusa noticia que, segundo Caldas de Almeida, que foi coordenador do Programa Nacional da Saúde Mental: “Quarenta por cento das pessoas com doenças mentais severas não têm tratamentos em serviços de saúde e, nos casos de gravidade mais moderada, a percentagem aumenta”.
Embora tenha havido progressos nos últimos anos, Portugal tem uma prevalência de doenças mentais das mais elevadas da Europa e “muitos doentes só têm acesso a serviços de saúde que não são da melhor qualidade”, apontou.
O responsável transmite preocupação com os cuidados a estes pacientes, numa altura em que o país enfrenta problemas económicos e cortes de verbas em várias áreas, incluindo na saúde.
“A crise financeira pode criar o risco de fragilizar os serviços e cuidados que temos obrigação de disponibilizar a estes doentes”, alertou Caldas de Almeida.
O Governo “quer acudir a muitas áreas e o setor das doenças mentais é mais ignorado”, tanto pelos responsáveis políticos, como pela população e pela comunicação social, pois “há um estigma associado”, referiu.
Por outro lado, “temos uma lei que é boa, mas já está desatualizada e muitos doentes são vítimas de abusos”, no contexto dos direitos humanos.
“Há muito a fazer para recuperar de uma desvantagem histórica” e com a crise “os problemas são mais prementes e há novos problemas”, resumiu Caldas de Almeida.
Um estudo nacional sobre saúde mental, Portugal é dos países europeus com mais elevadas taxas de prevalência de doença mental, sendo as perturbações mais frequentes a ansiedade e a depressão. Esta área recebe cerca de 3,5 por cento do orçamento para a saúde, segundo Caldas de Almeida.
Doenças do foro psiquiátrico aumentaram no último ano
Da mesma opinião comunga o psiquiatra Daniel Seabra, referido pela Lusa. O número de portugueses com doenças do foro psiquiátrico aumentou no último ano, devido à degradação económica e social, e o Sistema Nacional de Saúde (SNS) “não está” preparado para esse crescimento, disse hoje à Lusa o psiquiatra Daniel Seabra.
“Temos assistido a um aumento preocupante de patologias do foro mental, porque as circunstâncias de crise em que vivemos refletem-se na vida das pessoas, desencadeando reações a essas dificuldades.
Segundo aquele responsável, existem todos os meses dezenas de novos casos de perturbações mentais, resultantes de estados “de angústia, ansiedade e depressão” em pessoas cujas condições sociais se agravaram.
Daniel Seabra manifestou-se preocupado com “um crescimento acentuado para o qual o Sistema Nacional de Saúde não está preparado”.
“Não estão reunidas as condições que permitam tratar um doente mental nas mesmas condições de doentes com outras patologias, apesar dos esforços feitos com a integração dos centros de saúde mental nos departamentos de psiquiatria dos hospitais”, observou. “Gostava de ver uma maior humanização e apoio para os doentes do foro mental, para que não fossem parentes pobres do Serviço Nacional de Saúde”, sublinhou.
Para Daniel Seabra, “ainda há muito para fazer, no progresso da criação e ampliação de estruturas de apoio e tratamento da saúde mental”.
“Apesar do Ministério ter feito cortes para reduzir o desperdício e melhorar o rendimento das estruturas de saúde, ainda não vi quaisquer progressos”, destacou.
“Há inspeções, relatórios, mas nem sempre há medidas que corrijam e limitem esses gastos e desperdícios”, concluiu.
Demência vai triplicar em 2050
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a demência afeta 35,6 milhões em todo o mundo e vai triplicar em 2050. A doença atinge a população de todos os países, porém, mais de metade (58%) das pessoas com demência vive em países com baixo ou médio rendimento e em 2050 esta percentagem deverá subir aos 70%.
Mais de 35 milhões de pessoas são afetadas por demência em todo o mundo, número que pode duplicar em 2030 e mais do que triplicar em 2050, mas há falta de informação sobre o problema, alerta a Organização Mundial de Saúde.
Os custos de tratar e cuidar dos dementes estão estimados em 604 mil milhões de dólares (cerca de 460 mil milhões de euros) por ano, montante que inclui cuidados de saúde e sociais e o apoio aos cuidadores.
No entanto, somente oito países estão a desenvolver programas dedicados à demência, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Um relatório publicado pela OMS e pela entidade internacional do Alzheimer denominado “Demência: uma prioridade de saúde pública” recomenda o diagnóstico preventivo tal como a sensibilização pública para a doença e a melhoria dos cuidados e do apoio aos cuidadores.
A OMS realça a falta de diagnóstico como o problema mais relevante mesmo para os países desenvolvidos nos quais somente entre um quinto e metade dos casos de demência estão reconhecidos e controlados.
E quando é feito o diagnóstico, muitas vezes é numa fase avançada da doença.
O relatório aponta ainda a falta de informação e de compreensão da demência, o que cria um estigma na sociedade e leva ao isolamento tanto dos doentes como de quem cuida deles.
“O cuidado público face à demência, os seus sintomas, a importância de ter um diagnóstico e a ajuda disponível para os doentes são muito limitados”, uma situação que é necessário alterar, defende o diretor executivo da entidade internacional da doença de Alzheimer, Marc Wortmann, citado num comunicado da OMS.
A demência é normalmente uma doença crónica causada por várias patologias do cérebro que afetam a memória, o pensamento, o comportamento e a capacidade para desempenhar as atividades quotidianas.
A doença de Alzheimer é a causa mais comum de demência e as estimativas apontam para que seja responsável por cerca de 70% dos casos.
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