Vou aqui deixar a minha opinião por considerar meu dever fazê-lo, já que questões como estas só se colocam porque há um grande desconhecimento quer do folclore, quer da Convenção de 2003 ,que regula a atribuição do Património Cultural Imaterial da Humanidade.
Mas quero dizer que se quando do Cante estranhei que alguém me dissesse que “se o Fado foi porque é que o Cante não há-de ser”. agora sou eu que digo que “se o Cante foi porque é que o Fandango não há-de ser”? Ponto assente também, não voltarei ao assunto…
Ora bem, continuemos. Quem acompanha com regularidade as atividades da UNESCO, sabe que a Convenção de 2003 aparece para salvaguarda de um novo património imaterial que ainda não estava salvaguardado. Como se pode entretanto verificar, tratou-se de uma convenção, algo que foi convencionado, que não está por isso no âmbito do tradicional, do identitário.
Separemos entretanto as duas situações.
Folclore: passou de geração em geração chegando até nós, por via oral e por imitação, fazendo-se como se ouvia e via fazer, sendo que as influências que chegavam às nossas comunidades eram adaptadas local e comunitariamente. E essa evolução parou antes que a realidade local começasse a ser submersa pelos enormes fluxos de influências que nos chegavam e é por estes moldada e universalmente uniformizada. As formas de viver são cada vez mais iguais, não são semelhantes, não são representativas. A evolução naturalmente contínua, mas ali fica uma referência no tempo: é a data em que o folclore deixou de evoluir, é a data em que a globalização se começou a fazer sentir. Convenção de 2003 é também, “transmitido de geração em geração, é constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função do seu meio, da sua interação com a natureza e da sua história, incutindo-lhes um sentimento de identidade e de continuidade, contribuindo, desse modo, para a promoção do respeito pela diversidade cultural e pela criatividade humana” (Artigo 2º).
É, pois, este património cultural imaterial que a Convenção de 2003 pretende salvaguardar. Subentende-se ainda, e pelo menos foi dito que sim, que este património ao tempo da candidatura deve ser uma tradição viva o que significa não tradicional não identitária. Penso eu que fica aqui bem claro o que são cada um dos patrimónios. Mas mais clarificador é o extrato do artigo “Património Cultural Imaterial, um Património Inclusivo”, que a Dr.ª Clara Bettencourt de Carvalho, responsável pela Cultura na Comissão Nacional da UNESCO no nosso país em 2013 ‘publicou no espaço “Património.pt”.
“Sendo um património fundado nos conhecimentos e práticas, não se caracteriza pela autenticidade mas sim pela constante transformação e recriação, não se funda no tempo e na história mas antes na prática recorrente e na transmissão intergeracional, não visa preservar coisas mas salvaguardar saberes e conhecimentos. O olhar do sujeito desvia-se do objeto patrimonializável para se centrar no criador do património, que é chamado a ter um papel ativo em todo o processo”.
Será que o Fandango se enquadra neste património?
E por aqui me fico!