Faz este mês um ano que, numa ação conjunta, as agências espaciais europeias (ESA) e americana (NASA), lançaram no espaço (em 10 de fevereiro de 2020) a nave designada Solar Orbiter que, como o próprio nome sugere, se destina a girar em volta do Sol e a cumprir a missão de captar dados (e transmiti-los para a Terra) que permitam conhecer melhor os sobressaltos de vida por que vai passando a nossa estrela. Sabemos, há muito tempo, que sem a energia solar não haveria vida na Terra, não só como resultado da fotossíntese (processo pelo qual plantas e algas convertem água e dióxido de carbono em substâncias que constituem fonte de energia que alimenta os seres vivos), mas também pela evaporação de águas de rios e oceanos e consequente chuva de que resultam efeitos na diluição de nutrientes para plantas, erosão de solos e rochas por onde passam rios e outros cursos de água, a acumulação de sedimentos que (alguns deles) acabam por produzir rochas de tipos diversos e … um sem número de efeitos de que, na sua maioria, nem nos apercebemos na vida quotidiana.
No entanto, nem tudo é calmo e permanente no que resulta da atividade solar, razão por que não é nova a preocupação dos cientistas em conhecer cada vez melhor as causas e efeitos de algumas irregularidades e, em particular, a sensibilização de poderes políticos para a tomada de medidas no sentido de, na medida do possível, minimizar eventuais efeitos nefastos.
Vem a propósito recordar a minissérie dramática (COBRA) apresentada pela RTP 2 no final do passado mês de janeiro, a qual evidencia – para além de aspetos “próprios” da vida política – como uma equipa multidisciplinar constitui um gabinete de crise para enfrentar uma situação eminente de catástrofe, resultante exatamente de uma “explosão solar”. Os aspetos científicos incluídos no filme seguiram rigorosamente o já conhecido, quer teoricamente quer de experiências reais (bem menos graves), como o apagão ocorrido em 1968 em grande parte do Canadá e boa parte de região norte dos Estados Unidos e colocou aqueles territórios sem energia elétrica e com destruição considerável na rede elétrica, tragédia apenas atenuada pela beleza e profusão de auroras boreais, em quantidade, variedade e permanência bem superiores ao habitual, então visíveis até latitudes bem inferiores às mais comuns. Naturalmente, já antes haviam ocorrido outras ejeções de material solar que atingiram a Terra (a última, bem violenta, em 1859), mas, então, a vida no planeta estava muito menos dependente da energia elétrica, pelo que os seus efeitos terão sido muito menos notados. Na série referida, as circunstâncias são representadas muito mais agravadas, com a eliminação de satélites artificiais e a navegação terrestre, marítima e aérea, com aviões a perderem a orientação e a despenharem-se, vias de comunicação cortadas, hospitais sem energia elétrica e, por isso, sem meios para atender feridos em estado grave e … um sem fim de problemas, apesar de o início da erupção solar ter sido detetado algumas horas antes de chegar à Terra.
A missão Solar Orbiter tem como objetivo principal circular em volta do Sol – umas vezes mais distante (180 milhões de quilómetros), outras passando apenas a 42 milhões de quilómetros e encontrar sinais de que – em determinados pontos da “superfície” solar – se estão a desenvolver circunstâncias que vão originar as violentas ejeções de material, muito tempo antes de elas ocorrerem.
Esta órbita de excentricidade tão elevada, resulta de necessidades próprias da estabilidade de objetos que giram em volta de outros, mas também da intenção de aproveitar a “gravidade assistida”, ou seja, a aceleração que a nave “sofre” ao passar relativamente perto de um planeta, diminuindo assim consumos de energia para a manutenção em movimento regular e pequenas “correções orbitais” muitas vezes necessárias. Nesta missão, será várias vezes aproveitada a “gravidade assistida”, pelas passagens nas proximidades de Vénus (mais vezes) e, menos frequentemente, a poucas dezenas de milhões de quilómetros da Terra.
Em novembro próximo, ninguém verá (nem com grandes telescópios nem da Estação Espacial Internacional) a Solar Orbiter passar-nos “perto”, mas temos já a certeza de que, por essa ocasião, a “força da gravidade” associada à massa total do nosso planeta estará a contribuir para manter em órbita um conjunto de equipamentos com os quais queremos saber mais da nossa estrela e, consequentemente, prepararmo-nos melhor para preservar, na Terra, a vida que o Sol nos oferece.