Assentou praça em Lanceiros da Rainha, aos 18 anos e declarou ser padeiro. Ficou de serviço ao forno. Possuía três características: era muito alto, muito ágil e não resistia a uma piada.
Assim, uma ocasião, revoltaram-se uns soldados. Baldadas todas as tentativas de os dominar, o oficial pediu voluntários para negociar com os revoltosos mas só ele se apresentou. Foram-lhe dadas várias armas que poderia usar, mas ele não quis nada daquilo. Queria um lódão.
Veio o varapau. Ele dominou a revolta. Tinha metido os revoltosos todos no forno.
Não, não morreu nenhum.
Mas como recompensa, prémio, sei lá, enviaram-no para o forte de Elvas onde se empenhou a acarretar água em baldes, que o forte, apesar de os romanos e os mouros terem deixado construções impressionantes, com as quais não aprendemos nada, o forte não tinha canalizações. Nos intervalos aprendeu capoeira e a filosofia que apenas ensinou ao sobrinho de só lutar por causas justas e definitivas.
Agraciado com o perdão do fim do século, veio da tropa com bigodes retorcidos e frisados a ferro quente e o cachimbo, que lhe ficaram até morrer a rir com a última anedota que contou à filha quando o ajudava a deitar-se.
E o lódão ficou sempre atrás da porta.
Canção do exílio
Minha terra tem palmeiras
Onde canta o Sabiá,
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho, à noite –
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Gonçalves Dias (1823–1864)