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16 MAI 2021
OPINIÃO | "Manipulação Genética", por Anabela Ferreira
Por Jornal Abarca

A ciência e a vida humana estão cada vez mais associadas. As experiências com material genético humano são proibidas. Há, no entanto, uma enorme quantidade de questões sociocientíficas a abordar nestas áreas que englobam desde a engenharia genética, a clonagem, as pesquisas com células-tronco…

Como primeira consideração, relativamente à manipulação do genoma humano há duas vertentes díspares a ter em conta: por um lado, a chamada eugenia negativa relativa à remoção de características desfavoráveis do indivíduo. Por outro lado, a eugenia positiva, visando o melhoramento genético humano. Em ambas há certamente a vertente ética e a vertente do direito a considerar. Porém, são bastante diferentes, claro.

Qualquer mudança nestas áreas implica mudanças na conceção acerca da própria vida. A perspetiva individual e a perspetiva coletiva são muitas vezes dissonantes, pois com que custos para o interesse individual, pelo respeito pela integridade humana, pela vida do ser humano, pela sua integridade física e psicológica… se alcança o dito progresso do interesse coletivo?

Então, em que ficamos? Se me perguntam, considero que a complexidade é tão vasta que muito dificilmente não encontraremos para cada argumento favorável, outro contra. Há uns anos concordava plenamente com a proibição desta manipulação genética. Agora, não. A idade traz destas incertezas. Para muitas pessoas, sofri um retrocesso. Talvez. Contudo, pergunto, se cada indivíduo pudesse escolher entre ter ou não ter uma doença grave de origem genética, quem diria que a preferia ter? Ora, se essa doença se pudesse evitar antes do nascimento pela ciência, julgo que só responderia de forma negativa ao seu uso quem hipocritamente respondesse ou não se conseguisse colocar no lugar de um desses pacientes. Em geral, alguns argumentam que a pessoa vale por si e não pela doença ou deficiência que pode ter. Certíssimo. Contudo, é um fraco argumento. Duvido que alguém que sofra de determinada maleita, se lhe dessem a escolher, a selecionaria como sua característica.

A condição sine qua non seria se se garantisse a integridade, isto é, só se usasse essa manipulação no tocante à prevenção ou eliminação de doença ou incapacidade, bem como a equidade no acesso a esses cuidados. Pois não seria justo quem tivesse poder económico garantir uma descendência saudável e quem não tivesse esse poder ficasse sujeito ao que todos nós hoje ficamos, a roleta russa da genética. A integridade suprarreferida nunca poderia cair em futilidades como a cor dos olhos, da pele… ou outra qualquer característica meramente estética, ainda que se argumentasse, por exemplo, que a cor de olhos escura estaria mais preparada para climas quentes como o nosso ou o inverso.

Evidentemente que há o perigo do excesso, da excentricidade, do domínio pelo poder económico, chegando-se ao limite de um filho de alguém que investisse na programação genética ser perfeito, ou quase, e de uma pessoa que o não fizesse, ou pudesse fazer, ter um filho com esses problemas ou, simplesmente, comum, deixando ao acaso o resultado. Da mesma forma, o poder militar poderia construir o seu homem-soldado, a sociedade poderia produzir indivíduos “perfeitos” segundo moldes físicos e psicológicos determinados e instituídos, pois, no fundo, não seria isso tudo uma tentação em sociedades que cada vez mais privilegiam a norma e a uniformidade?

Como em tudo, ou quase tudo, há que ser relativista, há o aspeto positivo, o negativo e, acima de tudo, o que o humano faz com isso. Veja-se o uso dado à maravilhosa, espetacular e cheia de potencialidades descoberta da fissão do átomo que culminou, obviamente, com a bomba atómica ou nuclear que daí se criou e os seus efeitos monstruosos. Pobre génio Einstein nem ele conseguiu adivinhar ao que poderia chegar a estupidez do seu pouco semelhante. Mas isso é o ser humano no seu melhor e no seu pior.

Pois, estou a falar, mais uma vez, de uma caixa de Pandora.

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