-Tem dificuldade em andar ou subir escadas?
-Tem dificuldade nos cuidados pessoais, como tomar banho ou vestir-se sozinho?
-Usando a língua em que habitualmente se expressa, tem dificuldade em comunicar com os outros, por exemplo compreendê-los ou fazer-se entender por eles?
Eis as questões que acabei de responder nos censos 2021. É através destas respostas que o Estado tenciona obter dados concretos sobre as pessoas com deficiência. É dececionante verificar que se repetem os mesmos erros dos últimos censos ocorrido em 2011. Tinha a esperança de que desta vez houvesse outro rigor na recolha de dados sobre a nossa realidade, mas vejo que ainda não é desta vez que isso vai acontecer. Através das questões colocadas é impossível o Estado chegar a uma conclusão, porque nem todas as pessoas que têm uma incapacidade temporária, têm uma deficiência. Uma pessoa pode estar temporariamente impedida de se locomover, ler, ouvir ou ver, o que não significa que possua uma deficiência definitiva. Por exemplo, a maioria dos nossos idosos sente essas dificuldades devido à sua idade.
Estima-se que exista cerca de um milhão de pessoas com deficiência em Portugal, estima-se, porque como se pode verificar o Estado continua a não se preocupar em promover um levantamento rigoroso sobre nós. Os últimos censos, que ocorreram em 2011, ocultou a informação específica sobre os cidadãos com deficiência, nos que se encontram a ocorrer acontecerá o mesmo. Não foi por falta de alerta. Em 2011 as críticas ao método utilizado pelo INE não tardaram a surgir. Até a Secretária de Estado para a Inclusão das Pessoas com Deficiência, se manifestou, dizia ao jornal Público em 2016: “Não podemos ter dados exactos, porque fizeram questão de perder uma oportunidade fundamental de ter esses dados mais ou menos caracterizados. Alguém decidiu, por razões contabilísticas ou financeiras, que as questões relativas à deficiência iriam ficar fora do Censos de 2011. Tínhamos dados mais ou menos fiáveis nos Censos de 2001 e deixámos de os ter em 2011” e prometia resolver a questão ao avançar com censos próprios.
“Ainda não conhecemos a realidade por completo, porque esse mapeamento não está devidamente feito, onde é que as pessoas estão, onde é que elas podem estar e em que condições” já está decidido que vai ser feita "uma espécie de censos”, acrescentava.
Humberto Santos, atualmente presidente do Instituto Nacional para a Reabilitação, organismo que tutela a deficiência, na altura presidente da Associação Portuguesa de Deficientes (APD) também mostrou a sua insatisfação ao JN: "A nossa expectativa era que estes Censos pudessem ajudar a corrigir as deformações de informação que os Censos anteriores trouxeram, mas a forma como foram definidos não o vão permitir".
Tanto a Secretária de Estado como o antigo presidente da APD, ambos com cargos de relevo atualmente, pelos vistos mudaram de ideias.
São grandes as diferenças sobre a importância do rigor nas questões apresentadas. Dados Pordata: 2001: População residente com deficiência segundo os Censos: total e por tipo de deficiência: Auditiva 84.172; visual 163.569; motora 156.246; mental 70.994; paralisia cerebral 15.009; outra deficiência 146.069. Total de pessoas com deficiência 636.059
DADOS EM 2011: Cerca de 16% das pessoas entre os 15 e os 64 anos tinham simultaneamente problemas de saúde prolongados e dificuldades na realização de atividades básicas; Cerca de 50% da população idosa tinha muita dificuldade ou não conseguia realizar pelo menos uma das 6 atividades do dia-a-dia; 40,5% da população residente entre os 15 e os 64 anos afetada por problemas de saúde ou doença prolongados.
Grande diferença nos dados recolhidos. Em 2001 ficamos com dados concretos porque as questões se basearam na deficiência, em 2011 e nos que se encontram a decorrer, preferiram basear-se na incapacidade. Assim, mais uma vez ficaremos sem ter um retrato das pessoas com deficiência, e sem conhecer o nosso universo, continuarão a ser criadas políticas desfasadas da nossa realidade.