Não é por acaso que o Afeganistão é conhecido internacionalmente como “o cemitério de impérios”. Nos últimos 200 anos, o Afeganistão foi um atoleiro para britânicos, soviéticos e americanos. Todos eles conseguiram efectivamente conquistar o território, mas nunca o conseguiram governar ou manter estável durante muito tempo. Se recuarmos mais alguns séculos na história, até as investidas árabes sofreram de grande resistência por parte da população local. Tal foi a dificuldade, que a islamização total do Afeganistão demorou cerca de 200 anos a alcançar. A recente saída do Afeganistão teve pouco de retirada e mais de fuga. Os EUA e os seus aliados da NATO chegaram a um impasse que resultou de um claro esgotamento estratégico. A mensagem de liberdade, democracia e direitos individuais nunca conseguiu ganhar raízes entre a população afegã. Esta mensagem esbateu fortemente num país desgastado por décadas de guerra trazida, regra geral, por ingerências externas.
A jovem e incipiente democracia afegã vivia, permanentemente, a soro graças à presença ocidental no terreno, à ajuda financeira americana e aos fundos de organizações internacionais, como o FMI ou o Banco Mundial. Nunca foi um regime capaz de criar ou consolidar as instituições políticas existentes para gerir o país. À excepção da reconstrução europeia no pós-II Guerra Mundial, os EUA mostram que efectivamente têm a capacidade para derrubar regimes pela força, mas já não têm a capacidade de persuasão ou de atracção para criar instituições políticas que lhes permitiam manter o território sem resistência popular ou sem recorrer ao uso contínuo da força. A apressada e caótica saída americana de Cabul não consegue evitar as comparações com a saída americana de Saigão, durante a Guerra do Vietname. E se o Vietname foi um marco histórico que afectou a imagem americana no mundo, Cabul tem certamente um sério contributo a dar para o declínio, não só americano, mas também ocidental.
Nos últimos séculos, a Europa e, posteriormente, a América procuram dominar o mundo baseados na crença arrogante de que outros povos se deixariam persuadir pelos valores civilizacionais superiores do Ocidente ou, em alternativa, se renderiam pela força das armas. O Afeganistão mostra-nos agora que esta visão está ultrapassada.