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19 OCT 2021
CRÓNICA | "Os Vampiros atacam de novo", por Anabela Ferreira
Por Jornal Abarca

Desde o processo histórico da Reconquista Cristã que a visão ocidental do mundo se divide entre nós e os outros, o inimigo. Os reinos cristãos contra al-andalus. A religião era o móbil, mas esta motivação escondia, obviamente, de parte a parte, a motivação da cultura e visão ou perspetiva humana diferentes e os motivos habituais inerentes ao ser humano, como o domínio territorial e a riqueza associada e este.

Curioso é que passam milénios e a religião continua a ser o álibi para que a luta continue desenfreada. A pretexto de impor um Deus, mata-se, tortura-se, desloca-se do seu território uma população inteira. Parece uma questão irascível. Contudo, esta é uma face da questão. Apenas uma.

Conhecemos a necessidade do mercado escoar os produtos que fabrica. Cinco países fabricam cerca de 75% das armas do mundo.

Vamos chamar os vampiros pelos nomes. De acordo com o SIPRI (acrónimo para Instituto Internacional de Estudos para a Paz), em primeiro lugar, os Estados Unidos que encabeçam a lista dos produtores de armamento (com cerca de 61% das vendas) e se distanciam consideravelmente do segundo lugar que não poderia deixar de ser a arqui-inimiga China (cerca de 16%). A Europa não é inocente nem isenta de culpa. Apesar de só uma empresa britânica integrar a lista das 10 principais empresas vendedoras de armas, ao unirmos as empresas europeias elas alcançariam um nível semelhante aos anteriores lugares rivais… mais, o volume de negócios do top 25 de vendas de armamento tem vindo a crescer na ordem dos 8,5% e alcançou um patamar de cerca de 230 mil milhões de euros, ou seja, cinco vezes superior ao orçamento anual para as missões de manutenção de paz da ONU. Também o Médio Oriente com uma empresa que fundiu cerca de 25 grupos integra este top 25 e a Rússia diminuiu o seu volume de negócios nesta área não  por rebate de consciência ou humanitarismo extemporâneo, claro, mas, segundo a diretora do programa de armamento e gastos militares do SIPRI, Lucie Béraud-Sudreau, devido a contingências internas afetadas pelas sanções que foram impostas a este país pela comunidade internacional e devido à quebra do preço da energia do qual a economia russa muito depende.

Compreende-se perfeitamente a política de abandono das forças militares de teatros de guerra em países como a Síria e o Afeganistão. Têm que existir territórios de despejo de armas. Há que criar e estimular a necessidade para incrementar o consumo.

Ocorre-me a canção-grito de revolta “No Bravery” do iluminado e sensível James Blunt que de forma tão sentida interpreta este tema. Tendo sido, não por acaso, capitão do exército real britânico sabe do que canta.

No entanto, o mundo é um só. Na Síria, volvida mais de uma década de conflito armado, 12 milhões de sírios (metade da população) veem-se forçados a fugir produzindo a maior crise mundial de deslocações populacionais do século. Os países vizinhos são os mais penalizados, mas todo o mundo acaba por sofrer algumas alterações com estas migrações. Há países que funcionam como jangadas desejadas de acolhimento para estes povos. Não obstante, sabemos que ocupante a ocupante o peso pode ser demasiado e a jangada pode ir ao fundo.

O Afeganistão é o ponto recente de avanço dos outros…

Esquecem-se aqueles vendedores-vampiros que um dia a balança pode perder o equilíbrio e, quer por domínio do outro lado, já não passível de controlo, quer por implosão das sociedades dos deste lado, tudo possa transformar-se no caos.

Assim, usando ironicamente uma frase convencional, não se trata de algo pessoal, são apenas negócios. Mas estes negócios podem atingir todos, até os que se julgam intocáveis.

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