Levantar ainda é madrugada, espreitar pela janela e lá fora a escuridão da noite é quebrada apenas pela timidez das luzes ténues e baças dos candeeiros da rua na sua impotência para vencer o escuro e a chuva. Pequeno-almoço frugal e estremunhado, sai-se sonâmbulo de casa e caminha-se a torpeçar para a estação.
É a hora de partida do comboio da manhã, mais que um registo no horário, é um momento repetido de anos que já se incrustou no inconsciente do passageiro e torna a sua vida tão maquinal. O trem, com que compartilhará o destino nos próximos 60 minutos, chega envolto num clarão de luz irreal que penetra pela chuva miudinha e fere a vista ainda trôpega pelo sono, e num chiar ácido dos travões para junto à plataforma. Está na hora prevista, que o relógio na parede forrada de azulejos aponta com precisão e crueldade. E que tanto pode ser a das 5h 58, como das 6h 39 ou 6h 53 ou as seguintes, na cadência de despovoamento que a capital quer e impõe. (...)
Rui Maurício, presidente da Junta de Freguesia de São João Batista (Entroncamento), começou em 16 de agosto de 1969 a saga de todos os dias úteis se deslocar da urbe ferroviária para a capital. Trabalhava nos Telefones de Lisboa e Porto, empresa que mais tarde originaria a Portugal Telecom. Foi esse o primeiro dia a que se seguiriam 33 anos quase iguais. “Nos primeiros 20 anos, levantava-me às cinco horas e partia para Lisboa no comboio das 5h35, já ia muita gente nesse comboio. Ia para o meu emprego e, por vezes fazia trabalho extra, chegava a casa às oito ou nove horas da noite e jantava”, conta Rui Maurício. Todavia, como já nessa altura estava bastante ligado ao associativismo local, em particular à União do Entroncamento, ainda ia oferecer os seus préstimos associativos e só se deitava à meia-noite ou à uma, para no dia seguinte repetir o ritual. (...)
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