Há dias visitei o Santuário de Fátima. Sou ateu, mas sempre que visito uma nova cidade, não abdico de entrar numa igreja, numa basílica, em qualquer edifício religioso. Diz-nos muito sobre a história de um lugar e seu povo. A minha visita a Fátima foi apenas uma paragem num percurso com outros afazeres. Não gostei do que vi. Talvez esta visão seja resultado da minha visão sobre tudo aquilo em que a Fátima religiosa se suporta – a mentira do século –, mas é mais do que isso.
O edifício não nos leva para o estado de alma que outras construções nos remetem. A Catedral de Notre-Dâme em Paris, a Igreja de Santa Maria del Mar em Barcelona, ou até o Convento de Mafra, contam-nos a história de um povo que se esmerou, de gente que transformou a fé em sangue e suor para erguer um templo digno daquilo em que acreditavam, mas também de reinos ricos e megalómanos.
O Santuário de Fátima não me transmite isso. Vejo a história de um povo ludibriado por uma farsa, genialmente explorada por António Ferro e Salazar, e um edifício que ostenta a sobranceria da Igreja e não a devoção do povo. Pelo meio até há um corredor a convidar os peregrinos a percorrerem os últimos metros ajoelhados, prática completamente medieval e bem exemplificativa da relação actual da Igreja com os seus fiéis.
Mas chocou-me também a relação dos fiéis com o Santuário. Como referi, sou ateu. Mas respeito o local onde me desloco. Um templo, seja de que religião for, é um local sagrado. Não é um lugar para publicitar a fé.
Aliás, a fé e a caridade não se publicitam. É um processo íntimo, do eu com a divindade, e há pessoas que têm dificuldade em entender isso. Fazem da ida ao Santuário um momento de vaidade, tiram fotografias, e espalham pelas redes sociais com um chamativo “Dia de Agradecer”. Precisam de mostrar que foram agradecer? São tolos. Não percebem nada do que é a relação com o seu próprio Deus, não o meu. A vaidade, se bem lembro, é pecado.
Rezem, sem smartphones nas mãos.
Nota I:Não podia deixar de falar na Marine. Tenho a felicidade de me ter cruzado com pessoas fantásticas. A Marine, que entrevistei para esta edição no âmbito do Dia Mundial do Cancro, é uma daquelas pessoas que gostaríamos de ter como amiga. Uma mulher forte, inspiradora e alegre. A sua página, “Cancro Com Humor”, que sigo praticamente desde o início, é um tratado ao que faz sentido na vida: o amor e a felicidade.
Nota II:Há poucas coisas que me deixem mais revoltado do que injustiças sociais. Ninguém deveria passar fome. Nunca passei porque, em tempos longínquos, tive quem me desse a mão. Vejo os tais fiéis que não sabem do que falava o seu Deus a irem à missa, e esquecem a essência do que é o cristianismo. Foi num tempo longínquo, que parece ter sido noutra vida, mas eu não esqueço. Não vou à missa, mas não posso permitir que alguém passe fome. Se calhar, pensando bem, não sou tão ateu como penso.