Antes de mais quero agradecer à minha amiga Margarida Trincão este convite para colaborar no jornal “abarca”.
E hoje vou começar por contar o que me aconteceu há dias, mas só porque tenho muitas testemunhas, de contrário não dizia nem uma palavra porque tenho a certeza de que ninguém iria acreditar.
Estava eu na esplanada da praia, aqui na Ericeira, onde vivo. Relia um dos meus livros, porque às vezes os miúdos, nas escolas, fazem-me perguntas muito específicas, e eu já não me lembro bem de tudo.
Chega-se ao pé de mim uma senhora, que eu nunca me lembrava de ter ali visto, olhou muito bem para o livro que eu estava a ler e disse:
- “Leandro, Rei da Helíria”… É um livro muito bom!
Quando eu ia dizer “muito obrigada” já ela ia embalada numa converseta sem paragens:
-Tenho de admitir que é um bom livro, mas a mulher que o escreveu é das piores pessoas que alguma vez conheci! Para a senhora fazer uma ideia: o marido, que ela sempre tratou muito mal, morreu há uns meses e ela nem foi ao enterro! Tem 4 filhos, de que nunca quis saber, acho que nem nunca viu os netos, e anda sempre metida em sarilhos…
- Estou a ver que a conhece muito bem.
- Se conheço!! Acho mesmo que sou a pessoa que a conhece melhor—até porque as minhas amigas não têm paciência nenhuma para ela. Muitas até me dizem “mas por que é que tu perdes tempo com essa filha d…”, desculpe, eu sou uma mulher séria, e nunca digo asneiras mas com ela perco a cabeça… E sabe? A maldade dela às vezes até me atrai! Como é possível uma pessoa ser tão má?! Ela devia estar na cadeia há que anos, mas ninguém se queixa dela! Têm medo, é o que é… E se eu for sozinha fazer queixa dela, ninguém me acredita, tais as coisas que ela faz!!
- E a senhora costuma vir aqui muitas vezes?-pergunto
- Eu? Quase nunca!!! Só o medo de a ver pela frente. Tenho a certeza que perdia a cabeça!
Faz uma ligeira pausa e eu aproveito:
- Estou a ver que a conhece muito bem…
- Muito. Já lhe disse que devo ser a pessoa que a conhece melhor!
Insisto:
- Diga-me uma coisa: se a visse agora aqui, na sua frente, conhecia-a?
Deu uma gargalhada:
- Claro!!! Mas também lhe digo: se a visse agora aqui, desatava a correr e ia-me embora porque até me sinto maldisposta só de olhar para a cara dela. Do piorio! Garanto-lhe!
Foi então que eu me levantei da cadeira e lhe disse, muito calmamente:
- Então acho que é melhor ir-se já embora porque essa pessoa sou eu!
Ninguém imagina a correria que ela deu — e em segundos desapareceu.
As pessoas que estavam na esplanada ao pé de mim — ela falara sempre muito alto — são de opinião que ela estava ali à espera que , com aquela conversa toda, eu me distraísse e ela me roubasse (a minha carteira estava mesmo à vista)
Eu não sei. Se algum dos meus leitores tiver alguma ideia, por favor diga-me! Ofereço-lhe um cafezinho aqui na praia.