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23 AGO 2022
OPINIÃO | "O Verão do nosso descontentamento", por Armando Fernandes
Por Jornal Abarca

Ainda não chegou a meio, no entanto, as desgraças ocasionadas pelo larvar impetuoso, violento, assassino das labaredas em diversas zonas do País com particular intensidade no Centro, destruindo casas, culturas e toda a casta de instrumentos, utensílios e maquinaria e alfaias, levam-me a pensar nas pragas bíblicas que fazem parte do martirológio da civilização ocidental.

Sim, eu sei, nós sabemos, quão incomensurável é a nossa responsabilidade na falta de alimentos, na desleixada floresta de todos e de ninguém, no esbanjamento criminoso da água, sem esquecer o desnorte na preservação dos fundos marinhos, das montanhas, lagos e glaciares.

Estamos metidos numa puída camisa-de-onze varas, afiança o velho e sabedor rifoneiro que poucos estudam e meditam. Para quê? Os adeptos da cultura de cuspo vivem dependentes das plataformas digitais do cardápio das festas e festivais, dos movimentos de ocasião tutti-quanti, ao som mavioso das cigarras a soprarem notícias inquietantes acerca das pessoas e comunidades alvo das iracundas brasas a queimarem justos e pecadores porque as progressões das fogueiras tasquinham sem piedade e pudor.

O Estio não cessa de nos transmitir sinais de apreensão, ninguém se pode considerar seguro, a luxuriante Quinta do Lago provou-o de maneira exemplar, as alteridades climáticas prometem perenidade, o vidente Bolsonaro minimiza o pulmão Amazónia, os calores obrigam-nos a suar as estopinhas, os ortodoxos do clima dão azo a enormes disparates, nesta Fogueira de Vaidades o cisco produz chagas na pele a quem tiver o azar de o apanhar.

Ando a inventariar produtos alimentares no concelho de Santarém, modelos culinários e gastronómicos, é uma tarefa absorvente, sinuosa e difícil. Mas é, no desejo de as gerações vindouras escalabitanas conhecerem e promoverem as ancestrais existências de vidas quotidianas, em risco de perda, em virtude do frenesim global ma área da nutrição e… sobrevivência do múnus local. E, nós por cá, Abrantes? Tudo bem ao nível da lesma. Na mesma soturnidade!

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