O CCV Alviela, inaugurado a 15 de Dezembro de 2007, dedica-se ao estudo do carso, com exposições sobre a presença dos dinossauros na região e a vida dos morcegos. Paula Robalo mostra-se feliz com o trabalho realizado.
O programa Ciência Viva deve a sua existência às centenas de pessoas que diariamente trabalham nos centros, mas deve o seu nascimento a um homem: Mariano Gago. Em 1996, como ministro da Ciência e da Tecnologia, pensou mais alto. “Constatou que Portugal estava muito atrás dos outros países europeus nos indicadores de cultura científica. Ninguém sabia nada de ciência e ele sentenciou que isso não poderia ser”, conta Paula Robalo, directora executiva do Centro Ciência Viva (CCV) do Alviela, no concelho de Alcanena. “Entendeu muito bem que isso se mudaria através do trabalho com as escolas. No último Eurobarómetro publicado os resultados mostram que estamos na linha da frente. Vinte e cinco anos depois estamos a colher os resultados”. De 1996 até aos dias de hoje muita coisa mudou. Contudo, a missão do programa Ciência Viva mantém-se: criar “uma sociedade com acesso universal à cultura científica, que estimula os cidadãos a usar as suas competências de crítica, comunicação e acção individual e colectiva para lidar com a complexidade de um mundo assente na ciência e na técnica”.
“Alcanena deve estar muito orgulhosa deste espaço”
O sonho de Mariano Gago foi crescendo e espalhou-se pelo país: actualmente existem 21 CCV em todo o país, de Trás-os-Montes ao Algarve, passando pelos Açores. Entre eles está o CCV Alviela, no concelho de Alcanena, inaugurado a 15 de Dezembro de 2007. Ao celebrar quinze anos, Paula Robalo assume um “sentimento de missão cumprida” do trabalho feito. A ideia por trás deste espaço foi “valorizar o imenso património natural da nascente do rio Alviela e zona envolvente, funcionando simultaneamente como recurso estratégico de divulgação científica e educação ambiental”, refere a página do programa na internet. Paula Robalo destaca ainda a “localização maravilhosa” do centro, enquadrado na zona dos Olhos de Água, junto à praia fluvial. “Dá gosto vir trabalhar todos os dias”, diz divertida. Actualmente trabalham 12 pessoas no CCV Alviela, mas apenas seis estão na equipa educativa. Portanto, a equipa acaba por ser curta para a procura: “Temos visitas de estudo diariamente e não temos capacidade para receber 100 alunos de uma vez. O que fazemos é criar dois grupos em que um visita o centro e o outro as grutas, e à tarde trocam”. É um trabalho árduo, considerando os vinte mil visitantes anuais que o centro recebe, e que só é possível concretizar graças ao profissionalismo e dedicação de todos os trabalhadores. Paula confessa que “gostaria muito de aumentar a equipa para poder fazer mais. Gostaria de inovar, investir na parte de tecnologia para as visitas, de modo a modernizar um pouco e renovar a oferta em termos de exposições”. Ao décimo quinto aniversário é este o desejo de Paula Robalo que, ainda assim, não tem dúvidas sobre a qualidade do trabalho efectuado e as mais valias do centro: “Alcanena tem de estar muito orgulhosa deste espaço que é um dos Centro Ciência Viva mais dinâmicos do país”.
O carso, os dinossauros, os morcegos… café e baile!
O CCV Alviela divide-se em três exposições permanentes, além das habituais exibições temporárias de registos fotográficos ou artísticos, que são o carso, o geódromo e o quiroptário. Os nomes aparentemente complicados contêm explicações simples e interessantes. O carso, que origina a denominação deste CCV (Carsoscópio), “mostra a importância que a água da chuva tem na modelação de todo este território. É bastante visual e as pessoas entendem facilmente”, explica Paula. A preocupação ambiental é reproduzida na visita: “Também mostramos como estes sistemas são altamente vulneráveis à contaminação das águas e as pessoas ficam verdadeiramente sensibilizadas”. Para terminar este módulo é apresentado o filme “Nos caminhos da água” que expõe como “os 182 quilómetros quadrados da bacia alimentam a nascente do Alviela, estamos ao lado da maior nascente cársica do país e apenas uma das vinte mais profundas da Europa. É um património muito rico que queremos dar a conhecer”, alude. O geódromo leva-nos numa viagem de 175 milhões de anos à época em que os dinossauros habitavam a região do maciço calcário estremenho. O filme “Uma viagem impossível” é exibido através de um simulador de realidade virtual em que a cadeira acompanha os movimentos do filme, uma plataforma desenvolvida pelo Instituto Politécnico de Leiria, um dos associados do centro - o outro associado é a Câmara Municipal de Alcanena. Por último há o quiroptário. Ou como quem diz, os morcegos: “Temos uma exposição dedicada aos morcegos, muito emblemáticos no Alviela. Existe um abrigo maternidade na gruta da Lapa da Canada que fica no percurso interpretativo das nascentes do Alviela”. Dada a proximidade do centro a este abrigo, protegido pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, “houve esta necessidade do CCV Alviela ser um pólo de sensibilização para a protecção dos morcegos e a sua importância no ecossistema”, justifica Paula. Além da exposição foi desenvolvido o observatório de morcegos cavernícolas, um projecto pioneiro na Europa, que consiste na observação dos animais “através de câmaras de infravermelhos que funcionam como ferramenta científica sem incomodar a vida da colónia”. Paula Robalo nomeia outras actividades além das exposições como o “Café de Ciência” que se realizava às sextas-feiras à noite “e chegou a reunir mais de 60 pessoas”. Apesar desta actividade se ter quebrado com a pandemia, Paula mostra esperança num recomeço em 2023. Outro evento marcante que o CCV Alviela organiza é o Baile dos Morcegos, um jantar temático com a presença de investigadores e curiosos. “O último teve 114 pessoas, com gente a vir de Lisboa e do Algarve”, sublinha.
Escolas, mas não só
Dos vinte mil visitantes anuais do CCV Alviela a esmagadora maioria são de escolas, sobretudo dos distritos de Lisboa, Santarém e Leiria. Além das visitas de estudo o CCV Alviela dispõe do projecto “Escola Ciência Viva” que recebe alunos do Agrupamento de Escolas de Alcanena durante uma semana: “As crianças podem usufruir do espaço, é uma possibilidade maravilhosa para eles aprenderem de um modo diferente”, acredita Paula. “Temos um programa educativo que vai ao encontro dos conteúdos programáticos do Ministério da Educação. Aprendem de uma forma mais experimental, todas as semanas convidamos um investigador para falar com eles” acreditando que os benefícios não se dirigem apenas aos alunos: “Oferecemos também formação para os professores que acompanham as crianças e isso dá-lhes outras ferramentas”. O justo reconhecimento, surge depois: “Os miúdos contam aos pais o que fizeram aqui, e é muito giro ver o feedback dos pais. Esse reconhecimento deixa-me feliz e orgulhosa”, confessa. Contudo, não se pense que o CCV Alviela é um espaço exclusivo de aprendizagem para os mais novos. “Ao longo do ano temos mais oferta dirigida à população adulta: saídas de campo, workshops, oficinas, palestras, entre outros”. Paula Robalo diz que “há um plano de actividades para o visitante além das escolas” e lembra que o Ciência Viva “tem um programa de turismo científico que agrega os 21 centros da rede e que dá acesso a uma série de parceiros na região dos centros onde são oferecidos descontos, como em restaurantes ou alojamentos”. O potencial turístico da envolvente ajuda a captar visitantes: “Este é o ponto de partida ideal para explorar o Parque Nacional da Serra de Aire e Candeeiros (PNSAC), aliando o turismo ao conhecimento”. As visitas ao CCV Alviela podem ser efectuadas de terça-feira a domingo entre as 10.00h e as 18.00h, sem necessidade de marcação prévia excepto para grupos (acima de 10 pessoas).
De Lisboa a Alcanena sem carta de condução
Paula Robalo nasceu em Lisboa em 1972, formou-se na capital e, após um estágio no PNSAC começou a trabalhar na Expo’98: “Foi o meu primeiro emprego e não poderia ter sido melhor”. Depois foi convidada a fazer a instalação do Pavilhão Ciência Viva, onde era o Pavilhão do Conhecimento. Após o tornado que afectou as instalações do CCV Alviela, em 2008, o espaço foi alvo de uma requalificação. Rosália Vargas, presidente da Ciência Viva - Agência Nacional para a Cultura Científica e Tecnológica, “achou por bem aproveitar esse momento para fazer uma modernização do espaço e para colocar alguém na direcção de forma mais presente para incutir uma dinâmica que o centro não tinha”. Foi assim que surgiu o convite para Paula se estabelecer em Alcanena que aceitou pelo desafio: “Nem tinha carta de condução [risos]. Só percebi isso quando aqui cheguei e não vi o metro [risos]”, recorda divertida. Agradece todo o apoio que recebeu na comunidade: “As pessoas ajudaram-me muito. Fui muito bem recebida, foi uma adaptação engraçada. Este sítio é uma pérola”, confirmando as palavras que ouviu da Dra. Rosália Vargas antes de partir. Após dez anos não tem dúvidas: “Tem valido muito a pena”.